As pessoas o procuravam para falar da vida. Ele tinha alguma coisa que
deixava as pessoas confortáveis para falar. Uma contava sobre a decepção. Outra
sobre a frustração. Outra ainda sobre a busca. Sobre a loucura. Sobre a
vontade. Sobre as dúvidas. E sobre tudo o que incomoda a alma humana. Ele ouvia,
pensava e falava o que achava que devia falar ou calava o que achava que devia
calar.
E assim, o menino foi aprendendo sobre os incômodos mais comuns do ser
humano. Descobriu que pessoas completamente diferentes umas das outras são
capazes de repetir questões absolutamente iguais.
- Onde foi que eu errei?
- Por que eu insisto?
- Até quando?
Questões soltas no ar como um apelo. Ninguém quer resposta. Todos
querem a questão. E quase todos seguem fazendo as perguntas erradas e esperando
as respostas certas. Ele percebeu que há uma necessidade humana de colocar no
outro o erro, a falha, o problema. Ninguém diz “eu sou uma roubada”. Quando
diz, sempre aparece outra pessoa para comentar “você só fala isso porque sabe
que o outro vai querer dar jeito em você”.
E o tempo vai passando e as pessoas continuam repetindo os mesmos
padrões aceitos por todos. Assim, todo mundo pode ter pena de todo mundo e fica
decretada a cumplicidade do fracasso nas relações.
Isso assusta o menino. Ele só quer se entender melhor e oferecer o que
tem de melhor para as pessoas que ele acredite que entenderiam, que gostariam e
que teriam o melhor delas para oferecer também. Simples, mas aparentemente
incompreensível. As pessoas esperam os padrões conhecidos, a zona de segurança
delas. Ele não tem isso para oferecer. Ele acredita nele e não no senso comum. Ele
age como gosta e não como esperam que ele aja. Ele fala sobre sentimentos,
sobre sensações, sobre sonhos e as pessoas não entendem.
Durante muito tempo o menino acreditou que ele tinha sérios problemas. Se
todo mundo faz do mesmo jeito, o errado é ele. Pelo menos foi isso que ele
aprendeu cedo. Chegou até a tentar ser como todo mundo, mas não deu nem para a
saída. Quando se deu conta, estava fazendo as perguntas que ele ouvira tantas
vezes. Ser como esperavam que ele fosse fazia dele apenas mais um. Muito pouco,
quase nada.
Parou de esperar dos outros a cumplicidade da fantasia. Parou de cobrar
afinidades onde não havia. Parou de questionar os outros. Começou a olhar para
ele mesmo e a se divertir com isso. Começou a acreditar que o grande amor está
nele mesmo e que a única busca possível é por outra pessoa que também tenha um
grande amor dentro de si e que queira juntar os dois amores em um só.
Isso não tem receita. Mas também não tem “mimimi”. Isso só vai
acontecer quando tiver que acontecer. Se não fosse assim, ele publicaria um
anúncio:
PROCURA-SE uma mulher linda
por dentro e por fora, que goste de fantasias, que saiba manifestar amor de
várias formas, que sorria para o sol e se emocione com a lua, que seja
apaixonada pela natureza, que queria voar com balões vermelhos nas mãos, que
tenha valores e princípios dos quais se orgulhe, que goste de bichos e de
plantas e de flores e de mato e do mar, que não tenha medo de amar nem de ser
amada, que beije bem, que ame bem, que surpreenda, que provoque, que goste de
viajar, que assuma seus erros, que aponte meus defeitos, que me ajude e que
peça ajuda, que durma nos meus sonhos e que sonhe comigo, que me encante e seja
encantadora, que sorria, que chore, que grite, que gema, que suspire, que se
arrepie, que não tenha vergonha nem vergonhas, que acredite. Que me procure. ENTRAR EM CONTATO URGENTE. Ass. Menino
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