terça-feira, 26 de novembro de 2013

Há diferença entre amor e amar.


O menino teve lá seus traumas de infância, como todo menino. Sua relação com seus pais era boa, mas ele era inseguro. A irritação do dia-a-dia trazia eventuais exageros e isso lhe fazia um mal imenso. Sua mãe, talvez por uma ancestralidade italiana jamais encontrada, falava alto, ameaçava com palmadas e com um chinelo que ficou famoso na casa dele. Ela era um doce de mãe, carinhosa e amorosa como ela só, mas nos seus momentos de irritação, melhor sair de baixo. Seu pai era ainda mais severo. Como era um sujeito brilhante e tinha se acostumado a ser brilhante por toda a vida, cobrava a genialidade do menino e seu irmão como se fosse a coisa mais simples do mundo ser um gênio. Era um pai maravilhoso, responsável por todos os valores do menino, generoso e sempre superatento, mas era duro e severo e isso encolhia o menino. Ele só queria se sentir aceito e amado. Simples assim.

O menino cresceu e repetiu vários dos erros de seu pai e de sua mãe. Ele também falou mais alto do que devia, também cobrou e esperou mais do que os outros tinham para dar e também foi duro e severo, ainda que não quisesse ser. Estava criado seu conflito íntimo e particular.

Como fazer para encontrar o amor? Ele acreditou, durante quase toda a sua vida, que era isso o que ele precisava encontrar: o amor. Cantado em prosa e verso e música e imagens e de todas as formas possíveis, o tal do amor, nunca definido com a exatidão necessária, nunca tangível, nunca exato e sempre fascinante, desafiador, curioso, aventureiro, delicioso, forte e fundamental.

Pois foi assim que o menino escolheu viver sua vida. Buscava o amor nas pessoas que encontrava ao acaso ou de propósito. Buscava o amor desde o primeiro momento em que ele se fazia notar presente. Bastava sentir o cheiro de um amor possível para entregar-se com a maior intensidade do mundo àquela nova aventura de sentimentos e sensações. Seus amores sempre começaram como se não houvesse amanhã. Seus amores sempre foram pontuados por cores, músicas e momentos únicos. Tudo precisava sempre ser grande, superdimensionado para que fosse único na vida da mulher amada e tudo isso por uma simples razão: sua necessidade de sentir-se amado e aceito.

Viveu amores hiperbólicos por toda a vida. Viveu romances muito mais bonitos e interessantes que metade dos romances que havia lido nos livros, visto nos filmes. Romances que também tiveram finais, nem sempre felizes. Fez o que pode para guardar, de todas as pessoas que lhe deram amor em algum momento da vida, pelo menos um carinho que fosse eterno, que lhe permitisse sentir-se querido, aceito e amado ainda que ele mesmo não correspondesse mais ao amor.

Nos momentos de solidão refletia sobre suas escolhas, seu caminho, sua forma de lidar com o mundo e com os outros. Até que um dia, chuvoso e triste, quase melancólico, o menino descobriu que seu erro era acreditar no amor e não acreditar no amar. Olhou para trás e percebeu que por várias vezes na vida desviou sua busca do amar para o amor que a outra pessoa lhe pudesse ter. Esse amor era o mais importante e muito mais valioso do que o próprio direito intrínseco do menino amar.

Amor é diferente de amar.

Será então, que foi por isso que ele sofreu quando viu alguns amores acabarem? Será então que essa foi a razão de terminar relacionamentos com de pessoas que ele sabia lhe amarem mais do que a si mesmas? Será que foi isso que o fez sedutor? Ladrão de amores? Aventureiro irresponsável e inconsequente do amar de outras pessoas? Quanto egoísmo o dele. E mesmo que, entendendo, lhe caiam todas as fichas ele não se perdoa com medo de esquecer-se e repetir os mesmos velhos erros de toda sua vida. É certo que ele seguirá buscando o amor, mas é certo também que ele tem muito a aprender sobre o amar. E que ele consiga seguir em frente. Amém.



segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Menino, Coração de Leão.


Nasceu sob o signo de leão. Vai ver que é por isso que o menino sempre se encantou com as histórias de Ricardo, Coração de Leão. As lutas, a honra, os valores e tudo mais que circulam as lendas contadas até hoje em cada livro, cada filme, cada documentário, sempre o fascinaram. O menino queria ter nascido com o mesmo tipo de coração de leão de Ricardo. Mas isso não aconteceu. Nasceu mesmo foi com um coração de menino e teve que dar duro pra trabalhar nele, pra virar gente grande.

O primeiro trabalho era entender como fazer de seu coração um lugar mais bacana. Definir que valores ele deveria ter como meta para poder alcançar sua referência. Isso passava por amigos, família e amores. Em tudo ele precisaria ser nobre, honrado e comprometido para poder ter certeza de que estava no caminho certo. Foi testado diversas vezes. As pessoas não entendiam muito bem o que ele estava fazendo ou mesmo porque fazia de um jeito diferente de todos os outros. Mas ele permaneceu fiel ao que sentia e ao que queria sentir.

Teve grandes amigos por quem jurou amizade eterna. Foi traído e perdoou alguns. Mas, de nada se esqueceu. Com o tempo, percebia que as melhores amizades eram as despretensiosas, que nada cobravam, que não faziam drama, que estavam sempre dispostas. Quis ser assim para seus amigos. Quis não cobrar. Quis ser simples e nada esperar. Quis não fazer drama e começou a se doar para as pessoas da maneira que acreditava ser a melhor. Perdeu algumas vezes mais. Seguiu acreditando e, com um pouco mais de tempo, percebeu que tinha uma linda quantidade de amigos do jeito que ele sempre sonhara.

Acreditou que em família fosse diferente. A herança de genes e de valores os ligaria, por certo, para todo o sempre. Sua avó lhe disse diversas vezes: com família sempre podemos contar, é seu porto seguro. Mas não foi sempre assim. Decepcionou-se algumas vezes, perdeu contato com tantas pessoas que lhe eram tão caras que chegou a duvidar pertencer àquela família. O tempo, sempre ele, mostrou que as coisas não são como nos contos de fada. Que dentro da família havia sim, gente que lhe oferecia segurança, carinho, cumplicidade. Mostrou que nem todos são como esperamos que sejam, mas família também é escolha. E assim ele cuidou dos que lhe cuidavam e construiu sua própria família. E seguiu certo de que sua avó tinha razão.

Mas o seu desafio maior sempre foi o amor. Seu coração de menino leão o fazia crer no amor maior que qualquer amor. Amor único. Amor cúmplice. Amor cego, surdo e mudo. Amor maior que a própria existência, daqueles que ficam nas histórias contadas e passadas como ideal de geração em geração. Ele acreditava ser esta a única razão de sua existência: amar.

Descobriu no título de um livro que amar se aprende amando. Escolheu então buscar seu amor maior nas curvas das estradas da sua vida. Amou desde cedo e sempre com toda a intensidade do mundo. Amou com entrega e com o compromisso de quem acredita sempre que o melhor está por vir. Amou certo de que seria aquele o maior amor da sua vida. E chorou a cada despedida, a cada descoberta de que aquela não era a pessoa definitiva. E, por isso, precisou dos amigos, da família, de alguns copos, de muitas ressacas e de muitos poemas escritos com lágrimas molhando o papel e as letras.

O fim de cada amor lhe trouxe uma tristeza incomensurável. Voltavam nele todas as dúvidas de criança: seria ele capaz de possuir o tal coração de leão em que sempre acreditou? Seria ele o homem que sempre quis ser? Ainda haveria tempo para isso? E nada importava. Passados os momentos tristes de luto pela morte do sonho do amor eterno depositado naquela pessoa, ele seguia em frente, peito aberto, escudo baixo, fantasias na cabeça e todo amor que houver nessa vida para ser vivido.

...

E o homem, por trás do menino, a tudo olhava com o carinho das lembranças da infância. Tudo isso lhe explica, lhe perdoa, lhe ajuda  ser mais homem, mais feliz, mais menino.



quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Agulha no Palheiro


Mas afinal: o que é que as pessoas tanto procuram e que não acham nunca? A pergunta vale um milhão de dólares. Ninguém tem resposta e, ao mesmo tempo: todo mundo tem a sua própria resposta. A grande questão é: o que esperar de um relacionamento? A grande resposta são as coisas inesperadas que os relacionamentos trazem.

Difícil falar em nome dos outros. Por isso, acabo sempre falando da minha vida, mesmo que fale mais do que deveria. A única coisa que eu sei perfeitamente bem é que não tenho a menor ideia do que espero em um relacionamento. Não consigo e não quero racionalizar sentimentos. Meu sentimento sai de dentro do coração, não da cabeça. Eu sei, eu sei: já sou bem grandinho e devia estar buscando um relacionamento cem por cento baseado nas compatibilidades da vida.

Devia ter um check-list com coisas como. Alguém que goste de morar perto do mato, só para ouvir os passarinhos cantando de manhã. Alguém que goste de estradas e que esteja sempre disposta a entrar no carro e partir, sem rumo, atrás de uma praia mais bonita, um pôr-do-sol que mereça aplausos ou pra um restaurante diferente que o amigo do primo de uma amiga comentou. Alguém que curta os amigos e as suas conversas de botequim. Alguém que goste de andar e conversar enquanto anda. Alguém que solte a risada fácil nas piadas mais sem graça. Alguém que cuide de mim, mesmo que eu esteja apenas fazendo drama, quando me sentisse doente. Alguém que tenha valores sólidos de família e que acredite no amor incondicional pelos seus. Alguém que reclame pouco e que elogie muito. Alguém capaz de se emocionar com coisas simples. Alguém...

Mas a vida não é bem assim e isso acaba não sendo o bastante. Além de tudo isso, tem as expectativas, os traumas, os momentos de vida e o equilíbrio necessário. Ninguém é assim tão sob medida todos os dias. Tem dias mais apertados e dias soltos demais.

As tais expectativas, por exemplo, são bilaterais e é mais fácil ganhar na mega-sena da virada e sozinho todos os anos do que encontrar alguém que espere exatamente o que você espera da vida. Então você aprende que tem que ceder e que tem que perceber o tanto que a outra pessoa cede. Aí vêm os traumas. Eles dizem para você que nada disso adianta nada, lembram que você já tentou isso antes e se ferrou, sacodem com sentimentos ruins qualquer leve tremor no relacionamento e revelam a insegurança inerente a todo mundo. Se você conseguir passar por cima disso tudo, muito cuidado em perceber que o momento de vida de um nunca é o momento de vida do outro. E, haja equilíbrio.

E segue assim a eterna busca pela pessoa ideal. Ou melhor, pela pessoa idealizada. Seguimos diariamente acreditando em um milagre emocional. O de que de repente, ao cruzar uma rua, vamos esbarrar com alguém que vai fazer o tempo parar, dar início a um fundo musical romântico, trocar um olhar cheio do maior carinho do mundo e pronto: você já pode morrer feliz.

É claro que isso não vai acontecer. É claro que sabemos disso. Mas quem disse que ser claro é o bastante? O único jeito de encontrar uma agulha no palheiro é com um imã, por isso o melhor a fazer é cuidar de si mesmo, quem sabe assim você atrai a agulha que está procurando há tanto tempo.



segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Carta Aberta

Querida mulher invisível,

Puxa, quanto tempo que não falamos. Quanta coisa aconteceu. Um ano!!! Muito tempo que não venho ao teclado despejar palavras que soltas deveriam estar presas (isso é de um livro que eu ganhei).

Na última vez que trocamos palavras, estava indo viajar com meu irmão. A viagem podia ter sido melhor, mas foi bacana apesar das pequenas bobagens e brigas. Lá me encantei por uma moça e quase comecei uma nova história. O fato é que antes dela voltar ao Brasil conheci outra mulher, mais bacana, mais especial, mais a minha cara e me apaixonei novamente. Entrei de cabeça, do único jeito que eu sei fazer e juntos ficamos até agora. 

O namoro acabou, mas não vim falar sobre isso. Vim dizer que cresci! Aprendi um monte de coisas que não teria aprendido se ainda estivesse completamente preso a você como estive por tanto tempo. A coisa mais bacana que aprendi é que a alma cresce. Você sabia!?! Eu não tinha me dado conta. Acho que a maior parte das pessoas fica pensando se existe ou não a alma e não se dá conta do que anda fazendo com ela. Descobri que a alma se alimenta de amor. A cada vez que o amor chega, a alma cresce, fica maior e mais bonita. É muito bom saber isso, ter certeza disso! O melhor exemplo são os filhos. Mesmo só tendo uma, aprendi no momento que ela nasceu que eu me transformei imediatamente em outra pessoa. Minha alma cresceu numa explosão de amor que nunca tinha sentido antes e nunca senti depois. Mas se eu tivesse outro filho, tenho certeza de que a alma cresceria da mesma forma novamente. Desculpe falar de filhos, sei que o assunto dói em você, mas é só o exemplo, ok!?

Aprendi que os amores tem essa capacidade também. Claro que não é qualquer beijo na boca que transforma a alma em algo maior. Mas os amores trazem uma nova dimensão à alma e ela cresce, se transforma, evolui. Tem que ter o maior cuidado pra não matar isso, não expulsar o sentimento porque talvez ela volte a diminuir, não sei ao certo, nem quero descobrir. O fato é que me sinto maior hoje. Sinto minha alma viva, pulsando amor, pronta para dar amor e a receber o amor de uma forma diferente do que jamais senti. Meus relacionamentos não morrem: transformam-se. Todas as pessoas para quem eu disse “eu te amo” na vida, continuam vivas e amadas por mim. E como com os filhos, não existem dois amores iguais. Cada um tem seu papel na minha vida.

Com isso, descobri que eu estava errado quando disse que me sentia um livro na sua estante, que você um dia parou de ler porque o capítulo estava chato e foi ler outra coisa. As pessoas não são livros isolados. Na verdade nem leitores nós somos. Somos autores de um único livro possível, o das nossas próprias vidas. E eu entrei na sua como uma personagem que teve seu momento e seu papel. Você entrou na minha como um ponto fundamental de transformação. Teve quase o mesmo efeito na minha alma que o nascimento da minha filha querida. Descobri outra dimensão na alma e por isso sou e serei, para sempre, agradecido.

Os únicos outros livros são os romances que escrevemos juntos com quem quer escrever junto com a gente. Esses não se escrevem sozinho, não tem como.

Meu grande conflito foi matar você. Eu achava que precisava matar meu sentimento porque acreditei que se eu não fizesse isso, ele é que poderia me matar. A boa notícia é que ele não tem esse poder. Meu sentimento não me matará, ele me fará melhor e maior. E o grande livro da vida segue em frente.

Outro aprendizado: sou um manipulador emocional inconsciente! Risos... Eu explico: descobri que o que me faz mais diferente é a minha entrega e doação. Ao contrário do normal das pessoas, eu não meço os riscos de uma relação, apenas entrego todo o meu sentimento com a maior intensidade possível na busca desesperada de ser aceito, aprovado, acolhido. Insegurança pura.

Só que quando faço isso acabo impondo uma regra básica nessa relação: se eu estou dando tudo, você precisa dar tudo também. E isso é pesado demais. Fazer loucuras de amor fascina, mas demanda que a outra pessoa também as faça, mesmo que ela não tenha a menor ideia de como é que se faz isso. As reações são as mais diferentes, mas sempre passam pela insegurança que isso gera. É quando a pessoa se sente julgada e avaliada por tudo o que faz porque ela julga e avalia tudo o que eu faço e me coloca num nível que ela não conhece. Essa insegurança é ruim, gera questões e conflitos e acaba por ter um efeito contrário. Doido isso. Em resumo: a minha insegurança faz com que eu dê demais e isso acaba gerando insegurança na outra pessoa e os conflitos que levam o relacionamento ao fim.

Soltem os foguetes. Entendi isso claramente como nunca antes na história desse menino poeta.

Só que não...

Eu não tenho a menor ideia de como ser diferente disso, porque eu gosto de ser assim. Gosto de dar o meu melhor por inteiro, com toda a intensidade do mundo, passando por todas as dimensões possíveis do meu amor e da minha alma. Eu não quero dar menos. Quero dar por outra razão, não mais para ser aceito, mas para trocar por inteiro. E aí é que mora a expectativa da mulher ideal. O mínimo que eu espero é o máximo que ela puder me dar. Nem um pedacinho a menos.

Acho que, tendo aprendido isso tudo, fica mais simples resistir às tentações dos amores de ocasião. Pessoas que aparecem na minha vida como se tivessem saído de uma historinha de sessão da tarde e acham que eu sou o tal do príncipe encantado que elas ouviram falar nos contos de fada. O amor de verdade não passa por aí, nem por perto disso. O máximo que isso gera sou eu me transformando no “homem invisível” dessas pessoas. Haja banho de sal grosso e galhos e galhos de arruda.

Estou me sentindo melhor com essas “descobertas” todas. Me sinto mais pronto para viver o que eu acredito, mais seguro nas minhas escolhas, mais preparado para não entrar nas roubadas. Uma vez me disseram que as pessoas nem desconfiam que eu sou só um menino procurando a minha família. É isso mesmo, no fundo, no fundo: sou só um menino com alminha de poeta, procurando minha família, a família que quero construir do lado de uma menina, com alminha de poeta e que também busque o que eu busco sem medo de ser quem for por inteiro ao meu lado.


Beijos,