O menino morava, ainda bem pequeno, em uma rua que tinha por perto uma
floricultura. Era seu caminho para os cursos que fazia, era seu caminho para a
papelaria, era seu caminho para quase tudo. A cada passada pela loja o menino
parava. Era a vitrine mais bonita. Vasos e arranjos dispostos com uma linda
mistura de cores vivas. Parava e olhava e sorria.
Escutando um disco na vitrola do pai, ouviu um poeta dizer que: para
viver um grande amor era necessário abrir uma conta no florista. Logo, sua
imaginação de menino o levou até a loja, onde perguntou o que era preciso para abrir
uma conta lá. A dona da loja riu e perguntou quantos anos ele tinha. Ele disse.
Ela respondeu que não poderia abrir uma conta a menos que ele fosse um cliente
frequente, do tipo que ainda manda flores pelo menos toda semana. Ele agradeceu
e saiu pensando no assunto.
Ainda não tinha para quem mandar flores. Amava sua mãe, mas não era
esse tipo de flores que ele gostaria de mandar. Sua preocupação estava na lição
do poeta. Ele sabia que precisava viver um grande amor e queria começar logo. Com
tempo de errar algumas vezes, pensava.
O tempo passou e as paixões de infância adolesceram. Um dia,
finalmente, ele encontrou a mulher para quem ele gostaria de dar flores. Não teve
dúvidas: juntou sua mesada e entrou floricultura à dentro, decidido a
encomendar um buquê.
- Bom dia! Preciso mandar flores para uma menina. O que a senhora me
sugere?
- Temos rosas, orquídeas, vasos, arranjos... me diga uma coisa: qual o
motivo das flores?
- São para a minha namorada explicou, quase tímido, o menino.
- Então as rosas vermelhas são as mais indicadas. Significam paixão. É o
que se dá nessas ocasiões.
- Como assim: é o que se dá? Todos os namorados dão a mesma flor?
- Sim. Quando um homem quer dizer à sua namorada que a ama, o que se
faz é oferecer rosas vermelhas?
- Preciso pensar mais um pouco. Eu volto mais tarde. Obrigado!
O menino não podia acreditar. Havia um procedimento padrão para a
conquista e ele descobriu isso na floricultura. Nunca imaginou que houvesse um
ritual. Ficou desapontado e foi conversar com sua mãe para se aconselhar.
A mãe explicou que sim, eram as rosas vermelhas as flores indicadas
para demonstrar paixão, mas... Sempre havia um “mas”.
- Sabe meu filho, você não é obrigado a dar rosas vermelhas só porque é
o que todos fazem. Você pode escolher a flor que quiser, a que achar mais
bonita, a que lhe emocionar mais. Flores são como os sentimentos. Não podemos
dar qualquer sentimento para qualquer pessoa. É preciso saber escolher. Ah, mas
se escolher as rosas dê uma dúzia de 13 flores, nunca uma dúzia de 12. É outra
regra de educação, mas essa é importante e faz a diferença.
Sua mãe esclarecia e confundia. Ele entendeu que podia voltar à loja e
escolher o que quisesse, mas não entendeu bem sobre as 13 flores. Logo 13 que
ele associava com o azar do número. A conversa serviu para que ele
definitivamente não escolhesse as rosas.
Voltou à tarde até a floricultura. A moça o reconheceu e o cumprimentou.
Perguntou se havia se decidido. Ele disse que queria olhar com calma. Ela disse
que então iria fazer alguns arranjos com as flores do campo que acabaram de
chegar.
- Flores do campo? O que são flores do campo?
- Para mim são as mais bonitas. São flores pequenas que nascem nas
matas, nos morros, na beira de riachos e próximo às cachoeiras.
- Mas elas nascem juntas? Parecem tão diferentes umas das outras.
- É por isso mesmo que eu gosto tanto delas. Elas nascem separadas,
normalmente em fazendas ou sítios repletos de vida. Aí são colhidas aos poucos
com cuidado para que não deixem de existir por ali. E, por serem poucas, as
pessoas acabam juntando flores de vários tipos para vender tudo junto. Quando
chegam aqui, meu trabalho é só juntar as cores do jeito que eu gostar mais e
pronto. Os buquês ficam lindos!
A moça falava em flores e ele pensava em sentimentos. Imaginava que
cada buquê fosse capaz de juntar sentimentos que nasceram em vários lugares
diferentes e que ganharam várias formas diferentes. Sentimentos que nasceram
nas matas, sob o sol forte das manhãs. Sentimentos que nasceram nos morros de
onde se via o melhor pôr-do-sol. Sentimentos que cresceram à margem de rios
onde amantes se amaram. E outros que foram banhados com a alegria que só há nos
banhos de cachoeira. Todos esses sentimentos juntos ficam lindos, pensou ele.
- Decidido. Eu vou levar um buquê de flores do campo! Você pode fazer
um bem bonito? Bem cheio de sentimentos coloridos!?! – disse o menino que nunca
deu rosas à ninguém.
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