Um grande labirinto. O menino pensava que a vida era um grande
labirinto. Ele já estava andando havia muito tempo. Seguia seu rumo, sem rumo e
entrava em todas as entradas em que podia entrar. Entrava por uma porta linda,
cheia de flores e cheiro de mato e seguia certo de que esse era o caminho, mas
não era. Voltava ao início e buscava novas entradas. Entrava em outro canto,
meio escuro, mas interessante e desafiador. Seguia por entre estrelas e lugares
diferentes que não o levavam a lugar algum, a não ser de volta ao início.
O menino sentia-se perdido, cansado de errar, mas disposto a continuar
tentando. A cada novo caminho que ele seguia, encontrava algo de novo, algo que
ele não conhecia e aprendia. Entrou em caminhos curtos e em caminhos longos e
acabou sempre voltando ao início. Olhava para a entrada e pensava com ele
mesmo: “eu jurava que esse era o caminho certo...” Descansava um pouco e
voltava a procurar a porta que o levaria ao seu destino.
Uma vez adormeceu enquanto descansava. E no sonho lhe apareceu uma luz.
Tentou olhar, saber quem era aquela luz, mas não conseguia. Era de várias
cores. Pulsava como uma estrela. Tinha um brilho forte, bonito. Sentia que a
luz era cheia de vida. Ela flutuava a sua frente como quem quisesse mostrar o
caminho, pensava ele.
- Luz tão bonita, que bom que veio me ver. Será que você pode me
mostrar o caminho certo?
- Menino sonhador, não existe caminho certo.
- Então estive perdido esse tempo todo à toa?
- Claro que não. Você esteve o tempo todo seguindo seu coração. Isso não
é pouco.
- Mas, e o caminho que eu busco? Como seguir se não há caminho certo?
- Fazendo seu próprio caminho menino, fazendo seu próprio caminho...
E as palavras ficavam no ar enquanto a luz parecia ir para longe. O
menino queria seguir a luz, mas não conseguia. Estava paralisado, tentando
entender o que havia acontecido. Acordou ainda assustado com o que tinha acontecido.
Era dia claro. Olhou para o lado e viu que o lugar de onde ele sempre partia e
para onde ele sempre chegava estava muito mal cuidado. Uma grande bagunça. Resolveu
que iria arrumar aquilo tudo antes de tentar de novo. Quem sabe assim ganhasse
tempo para entender o que a luz dissera.
Começou por recolher do chão as memórias que trazia de cada um dos
caminhos que havia seguido. Encontrou uns guardanapos e já ia jogá-los fora
quando viu que em cada um deles havia algo escrito. Sentou-se e começou a abri-los
com cuidado. Eram poesias, pequenos versos que ele mesmo havia escrito nas
mesas dos bares por onde esteve nos primeiros caminhos que escolheu seguir. Riu
de si mesmo e dos fragmentos de emoção que ele havia tido a coragem de escrever
ali. Guardanapos de bar, pensava ele. Que tipo de gente escreve poemas em
guardanapos? E riu, se dando conta que ele era o tipo de gente que fazia isso.
Guardou os guardanapos com cuidado e voltou para a arrumação.
Outros papéis lhe chamaram a atenção. Estavam em um canto, quase
amarelados. Estavam dobrados e tinham pequenas marcas nos cantos. Eram coloridos
e ele parou novamente para ver do que se tratava. Abriu o papel verde claro e
encontrou uma mensagem de realejo. A marca era do bico do periquito que havia
escolhido sua sorte. Na sua memória, o som gostoso do realejo voltou correndo,
e ele sentou-se para ler o que o futuro lhe reservara. Eram coisas boas e ele
sorriu um sorriso de menino. E guardou os papéis, com carinho, em um lugar bem especial.
Parou novamente e pensou em tomar um café. E um cheiro de café queimado
com açúcar invadiu o ambiente. E ele fechou novamente os olhos e lembrou-se da
cozinheira da casa dos seus avós que pingava o café no fundo de uma pequena
panela e o fervia com açúcar para se deliciar com o sabor forte e com o cheiro
doce. O sabor lhe voltou fácil. Fez e tomou o café da mesma forma que a velha
cozinheira havia lhe ensinado nos caminhos de criança. Ganhou ânimo para
continuar e voltou à arrumação.
E pelo tempo em que se dedicava a varrer, encontrar e guardar
lembranças, jogar fora o que não prestava para nada, passar pano para polir as
melhores memórias, ele se dava conta do tanto que havia caminhado. Quantas lembranças,
quantas memórias, quantos sabores, cheiros, visões, sonhos, fantasias. Quanta
coisa...
E quando acabou de colocar a última lembrança no lugar devido,
assustou-se. Uma luz invadiu o lugar, a mesma luz dos seus sonhos e ele sabia
que não estava mais dormindo.
- Você fez um belo trabalho aqui.
- Era preciso
- Sim, era preciso para que você pudesse encontrar seu caminho certo.
- Mas não sai do lugar! O que você quer dizer com isso?
- Que já não há mais portas. Não há mais idas e vindas. É só seguir em
frente. Seu caminho é onde você quiser ir. Você não precisa mais se perder para
se encontrar.
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