(Minha homenagem a D. Sarah Maldonado, um exemplo de mulher que virou beija-flor.)
O menino certa vez subiu a serra para conhecer um lugar novo. Ele foi
junto com a menina que queria mostrar a ele seu lugar especial. Era lindo o
lugar. Tinha grama, tinha flores, tinha gente, tinha amor. O menino se encantou
pela serra da menina. Sentiu-se em casa e feliz. Foi recebido por todos como se
fosse um deles e isso o deixou ainda mais feliz, ainda mais menino.
Logo que chegou notou um beija-flor. Era um beija-flor mãe. Percebia-se
fácil porque ela não parava um só instante, sempre em busca do melhor para os
seus. Ia de um lado para o outro, voava rápido, delicadamente e a todo instante
uma novidade. Ora cuidava de suas plantas e flores para que todos vissem a
beleza do seu mundo, ora se esforçava para oferecer o melhor que pudesse
oferecer apenas para ver sorrisos.
Não era nova, mas era viva. Voava com uma rapidez que impressionava.
Batia as asas milhares de vezes por minuto. Ia de flor em flor acariciando a
cada uma com o mesmo cuidado. Cuidava do seu ninho e do seu companheiro com
dedicação única. Era lindo ver aquele beija-flor voando. Às vezes cansava-se e
fingia que não estava cansada, que apenas queria pousar um pouco. Fazia isso
para que ninguém dissesse a ela que ela deveria parar de voar. Ela não
conseguiria. Voar e beijar as flores era o que ela mais amava fazer.
O menino olhava o beija-flor voando e encantava-se. Queria retribuir o
carinho que mesmo ele, recém-chegado, ganhava sem distinção. Queria dizer a ela
o quanto seu voo era bonito, o quanto aprendia com seu desapego, com sua
dedicação, com sua forma direta e honesta de ser. Queria dar algo pelo tanto
que recebia.
E o menino visitou a serra da menina muitas e muitas vezes. E o
beija-flor sempre estava lá. Parece um bibelô diziam. Era de uma delicadeza sem
nome, sem comparação. Era a alma daquele lugar. E batia as asas com um esforço
que só ela conhecia e que escondia atrás de um sorriso bem a sua maneira. De
vez em quando cedia ao cansaço e todas as flores vinham rápido de onde
estivessem acudir o beija-flor. Davam carinho, davam beijos, davam conselhos e
amor e o beija-flor retribuía com um olhar de dever cumprido. Recebia o carinho
e os beijos com doçura, dispensava os conselhos e compartilhava o amor. Suas
flores estavam grandes, bonitas e inteiras. Ela tinha orgulho de cada uma delas
e dos beija-flores que vinham lhes cuidar.
O menino se emocionava. Via um amor sem igual. Ele nunca teve aquilo,
nunca tinha visto aquilo. Sua referência era outra, menos viva, menos bela,
menos intensa. Menos.
Um dia recebeu a notícia que o beija-flor havia voado para longe e que
não voltaria mais. Descansaria em um mundo de flores, onde a chuva não lhe
causaria mais medo, onde não haveria raios ou trovões. Onde poderia bater suas
asas com a força de sempre e cuidar de todas as suas flores com o mesmo amor
que um dia fez dela um beija-flor.
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