O menino teve lá seus traumas de infância, como todo menino. Sua relação
com seus pais era boa, mas ele era inseguro. A irritação do dia-a-dia trazia eventuais
exageros e isso lhe fazia um mal imenso. Sua mãe, talvez por uma ancestralidade
italiana jamais encontrada, falava alto, ameaçava com palmadas e com um chinelo
que ficou famoso na casa dele. Ela era um doce de mãe, carinhosa e amorosa como
ela só, mas nos seus momentos de irritação, melhor sair de baixo. Seu pai era
ainda mais severo. Como era um sujeito brilhante e tinha se acostumado a ser
brilhante por toda a vida, cobrava a genialidade do menino e seu irmão como se
fosse a coisa mais simples do mundo ser um gênio. Era um pai maravilhoso,
responsável por todos os valores do menino, generoso e sempre superatento, mas
era duro e severo e isso encolhia o menino. Ele só queria se sentir aceito e
amado. Simples assim.
O menino cresceu e repetiu vários dos erros de seu pai e de sua mãe. Ele
também falou mais alto do que devia, também cobrou e esperou mais do que os
outros tinham para dar e também foi duro e severo, ainda que não quisesse ser. Estava
criado seu conflito íntimo e particular.
Como fazer para encontrar o amor? Ele acreditou, durante quase toda a
sua vida, que era isso o que ele precisava encontrar: o amor. Cantado em prosa
e verso e música e imagens e de todas as formas possíveis, o tal do amor, nunca
definido com a exatidão necessária, nunca tangível, nunca exato e sempre
fascinante, desafiador, curioso, aventureiro, delicioso, forte e fundamental.
Pois foi assim que o menino escolheu viver sua vida. Buscava o amor nas
pessoas que encontrava ao acaso ou de propósito. Buscava o amor desde o
primeiro momento em que ele se fazia notar presente. Bastava sentir o cheiro de
um amor possível para entregar-se com a maior intensidade do mundo àquela nova
aventura de sentimentos e sensações. Seus amores sempre começaram como se não
houvesse amanhã. Seus amores sempre foram pontuados por cores, músicas e
momentos únicos. Tudo precisava sempre ser grande, superdimensionado para que
fosse único na vida da mulher amada e tudo isso por uma simples razão: sua
necessidade de sentir-se amado e aceito.
Viveu amores hiperbólicos por toda a vida. Viveu romances muito mais
bonitos e interessantes que metade dos romances que havia lido nos livros,
visto nos filmes. Romances que também tiveram finais, nem sempre felizes. Fez o
que pode para guardar, de todas as pessoas que lhe deram amor em algum momento
da vida, pelo menos um carinho que fosse eterno, que lhe permitisse sentir-se
querido, aceito e amado ainda que ele mesmo não correspondesse mais ao amor.
Nos momentos de solidão refletia sobre suas escolhas, seu caminho, sua
forma de lidar com o mundo e com os outros. Até que um dia, chuvoso e triste,
quase melancólico, o menino descobriu que seu erro era acreditar no amor e não
acreditar no amar. Olhou para trás e percebeu que por várias vezes na vida
desviou sua busca do amar para o amor que a outra pessoa lhe pudesse ter. Esse
amor era o mais importante e muito mais valioso do que o próprio direito
intrínseco do menino amar.
Amor é diferente de amar.
Será então, que foi por isso que ele sofreu quando viu alguns amores
acabarem? Será então que essa foi a razão de terminar relacionamentos com de
pessoas que ele sabia lhe amarem mais do que a si mesmas? Será que foi isso que
o fez sedutor? Ladrão de amores? Aventureiro irresponsável e inconsequente do
amar de outras pessoas? Quanto egoísmo o dele. E mesmo que, entendendo, lhe
caiam todas as fichas ele não se perdoa com medo de esquecer-se e repetir os
mesmos velhos erros de toda sua vida. É certo que ele seguirá buscando o amor,
mas é certo também que ele tem muito a aprender sobre o amar. E que ele consiga
seguir em frente. Amém.
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