O pai havia avisado e repetido inúmeras vezes: - Não jogue bola na
garagem! O menino sabia que não podia e nem devia, mas mesmo assim, de vez em
quando, dava uma fugida para chutar contra o gol imaginário que ficava entre o
elevador de serviço e a escada de incêndio. Eram gols narrados com a imaginação e com a emoção que só os meninos possuem. Gols com estilo, precedidos de dribles inesquecíveis. Ele mesmo
ganhava o nome de seus ídolos e, tocando a bola dele para ele mesmo, ganhava
ainda outros nomes até a conclusão com o chute a gol comemorado como se fora
final da Copa do Mundo.
Empolgado em um dos lances históricos protagonizados por ele e sua bola
Dente de Leite. O menino arriscou um lançamento em profundidade. O tiro certeiro
encontrou a cabeça da antena do carro de seu pai quebrando o útil artefato e
levando o artilheiro ao desespero. A bola quicou solitária ao lado da antena no
chão da garagem e o menino foi ver de perto a falta grave que havia
cometido.
Jogo parado. Ele só conseguia pensar no pior. Sabia que sua punição
seria grave. No mínimo um cartão amarelo ou quem sabe até mesmo um vermelho.
Imaginou a bronca do juiz e a raiva dos jogadores do outro time que logo o
cercariam para punir com violência o lance infeliz.
Resignado, colocou a bola embaixo do braço e deu a peleja por encerrada.
Tomou o rumo dos vestiários, chamando o elevador e subiu em silêncio até o
sexto andar, onde morava. Deixou a bola na área de serviço, passou uma água nas
mãos e no rosto e foi procurar o pai que estava deitado, lendo como de costume.
Deitou-se ao lado do pai e disse:
- Pai, eu sei que você me disse para não jogar bola na garagem, mas
mesmo assim eu fui lá e joguei. E pior, quebrei a antena do seu carro com uma
bolada.
O pai sequer baixou o livro e apenas respondeu: - Tudo bem meu filho.
Tudo bem? Como assim? O menino não entendeu nada e perguntou: - Mas
pai, você entendeu? Eu quebrei a antena do seu carro com uma bolada! Você não
vai me dar uma bronca, me colocar de castigo?
- Entendi sim meu filho. Mas não posso castigar você por me contar a
verdade. Chego a ficar feliz. Ainda bem que foi a do meu carro e obrigado por
me falar.
E o menino nunca mais sequer pensou em mentir.
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